Monday, January 16, 2006

Quatrocentos

A narrativa segue e o enredo é cada vez mais complexo. A caneta parece não querer parar e segue desenfreada, obrigando os dedos já calejados e dormentes a prolongar este seu ofício.Estou cansado e meio adormecido. Os personagens da minha história tomam conta da situação e decidem o rumo dos acontecimentos. Estamos já irremediavelmente envolvidos e eu preocupo-me com o seu futuro, ainda imprevisível para mim.Ganharam vida própria e a minha caneta segue, desenfreada, segundo a sua vontade. Quero parar, apagar, corrigir, mas não, não consigo!Estarei a ficar louco? Estou a sonhar? Os meus personagens ganharam vida própria? Será isto a inspiração? Volto a mim, olho para o que está escrito. Começo a ler. Estranho, não me recordo de ter escrito nada disto. Diálogos, enredos, intrigas, alegrias e desgraças, tudo descrito com uma harmonia ao mesmo tempo bela e simples.A história é bonita, fala de dois amigos, separados há muitos anos e a história vai sendo contada através das lembranças de cada um e do ponto de vista sobre situações comuns e as respectivas atitudes tomadas perante situações comuns. Assim percebemos a riqueza da sua amizade, os momentos de alegria, os medos e receios, as inseguranças e as emoções que levam à trágica separação quando tinham tudo o que precisariam para viver um grande amor.Estou encantado. Ao mesmo tempo, assustado.Escrevi isto e gosto do que acabei de escrever. Perdi a sonolência que me prendia ainda há pouco e interrogo-me: como é que conseguimos escrever? De onde vêm as ideias para o que escrevemos? Serão o resultado das experiências vividas ou de nos colocarmos em situações que conhecemos? Seremos capazes de verdadeiramente ”criar” algo de novo ou tudo aquilo que conseguimos conceber será resultado apenas do contacto com o mundo que nos rodeia? Não, não quero pensar nisto! Escrever devia ser uma coisa natural, devia ser música para os ouvidos, devia exprimir exactamente aquilo que sentimos.Mas não! Custa-me tanto escrever, nunca estou satisfeito. É muito frustrante querer dizer algo e, quando lemos, nunca soar como aquilo que estamos a pensar. E então, após um período, parece que tudo encarrila, tudo se encaixa, tudo flui como água pela cascata abaixo. E é pura magia, ter a satisfação de escrever, de ler, de viajar por frases adentro, perdermo-nos em teias de palavras e deixarmo-nos levar como uma folha solta ao vento nas fortes brisas de Outono.

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